"O som não permanece neste mundo; ele desaparece no silêncio."
Daniel Barenboim

domingo, 28 de fevereiro de 2010

OUTRO HOMEM ESPECIAL

Lá pelos meus 20 anos, iniciando a carreira de cantor, preocupado com o futuro das artes no Brasil, tomei conhecimento de um homem que, foi, mesmo sem sabê-lo, importante na minha formação cultural: José Mindlin. Seu amor pelos livros; seu grande desejo de "inocular" o vírus do amor pela leitura; seu interesse pela cultura deste país, enfim, foram tantos os desejos e realizações de José Mindlin! Tive o grande prazer de vê-lo em algumas de minhas apresentações. Em uma delas ele me disse que havia sido um prazer me ouvir mas que também sentia por saber que eu iria para fora do país. Não fui. Outra vez, tomando um café e fazendo hora para ir ao lançamento do livro de um amigo, vejo-o entrar no Viena. Fomos, minha mulher e eu, até ele e nos sentamos juntos. Conversamos sobre o número de estrangeiros que são convidados, ano após ano, a se apresentarem em nosso país, tomando o lugar de artistas nacionais. Já com seus 90 anos, completamente lúcido, extremamente gentil, nos contou um pedacinho de sua história pela luta em prol de nossa cultura. Nós o ouvíamos falar com a tranquilidade e sabedoria que lhe eram peculiares. Um homem sábio. Apesar de não estar mais entre nós, seu José continuará sendo um exemplo e sua obra sempre estará presente, testemunhando que por aqui passou alguém que fez a diferença.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

AQUARELA

Em 2001 fui estudar em Milão e fazer uma série de apresentações em alguns países da Europa. Fiquei impressionado com toda a arte que vi e, mais impressionado ainda, com a minha ignorância. Voltei de lá com o desejo de conhecer arte para poder apreciar melhor. O modo mais interessante que encontrei foi colocando a mão na massa. Comecei a pintar e não parei mais. De lá pra cá aprendi algumas coisas. Várias delas têm o mesmo princípio que a arte do canto. Assim como cantar, pintar envolve muito mais coisas que simplesmente ter prazer. Sigo investigando.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

YOLANDA MOHALYI

De longe, profundidade. De perto, intimidade. Pedaços de afeto.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

SAIA JUSTA

No último sábado cantei em um evento aqui em São Paulo. Eu deveria cantar um repertório de canções napolitanas. Chuva, falta de luz... Cantei a luz de velas e as pessoas curtiram muito. Antes disso, porém, me deparei com uma situação até bastante comum: aguardávamos a vinda das pessoas de um outro salão e um encarregado que ali estava, pediu que fossemos fazendo um "sonzinho" pra chamar o público. O que, para uns, seria uma coisa absolutamente normal, para nós, músicos eruditos, não é. Em primeiro lugar, não improvisamos. Segundo, estudamos muito para que as pessoas usufruam da música, da arte que lhes oferecemos. Logo, som ambiente não é a nossa praia. As pessoas, claro, não sabem desses detalhes. O tal "faz um sonzinho aí" mexe um bocado com nosso ego. E mais: temos que dizer que não haverá "sonzinho". Daí somos grossos e metidos. Falei apenas a verdade: "nós não fazemos sonzinho".

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

(L) IMITAÇÃO NOSSA DE CADA DIA

Sandálias, cabelos, peitos e tantos outros acessórios são, todos os dias, copiados e re-mostrados por aqui e por ali. O que deveria ser uma opção pessoal, virou modismo. O que deveria ser natural, agora tem marca. Digo isso porque recebo algumas pessoas que querem cantar como a Amy Winehouse , como a Sandy e por aí vai. Depois de dizer pra pessoa que pra cantar como fulano ela deveria ter nascido como ele, as caras de decepção são inevitáveis. Que difícil ser vc mesmo! Engraçado mesmo é quando o que quer imitar outra pessoa, tem uma voz bem melhor - o que não é raro - que a pessoa invejada. Essa é uma situação constrangedora. Esse achatamento das possibilidades individuais e únicas do ser humano é um dos grandes males que sofremos. No caso da voz me parece algo gravíssimo, pois ela é única, como único é o seu proprietário. A voz é como uma impressão digital. Cada um tem a sua. Não dá pra imitar sem se perder. "Quero imitar fulano porque gosto da música que ele canta". Ok, mas pra isso vc pode cantar com sua própria voz. Não serve. Tem que ser igual a ele. E por aí vai. Porque o cantor objeto da imitação é famoso, faz sucesso, toca na novela, ele está certo, e a opinião do outro, no caso o professor, não conta. Como se não bastasse o desejo de imitar a voz, deseja-se imitar, também, a interpretação. Essa então é outra longa história. Eu ia encerrar dizendo que "nesses casos só rindo mesmo!", mas preferi dizer que é foda.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

UM HOMEM ESPECIAL

Saindo desse triângulo Carreras Domingo Pavarotti, gostaria de apresentar outros cantores por quem tenho grande apreço. Vou fazer isso em doses e sem ser em sequência. Hoje apresento o tenor italiano PIER-MIRANDA FERRARO. Nascido em 1924, Ferraro teve seu apogeo nos anos 1960/70. Atuou várias e várias vezes no La Scala e em outros importantes teatros europeus. Aqui no Brasil podemos encontrar facilmente uma de suas gravações: La Gioconda, com Maria Callas. Importante frisar que em 60/70 estavam em atividade outros dois monstros sagrados: Del Monaco e Franco Corelli. Ferraro ficou, assim, um pouco escondido pelo brilho dos colegas, mas não fica a dever nada a eles. Conheci Ferraro pessoalmente. Aliás, tive o privilégio e a honra de ser seu aluno. Ganhei a Bolsa Virtuose do Ministério da Cultura e fui aceito pelo maestro Ferraro. Nossos encontros se davam em seu estúdio na cidade de Milão. Aos poucos fui conhecendo aquele artista que optava sempre pelo modo mais limpo de interpretar e pela não complicação de algo tão abstrato como a voz. Afetuoso e generoso, Pier-Miranda sorria com os olhos de uma criança, um sorriso puro e limpo pra um homem que, naquela época, 2001, contava com seus 77 anos. Meus momentos favoritos eram aqueles em que ele demonstrava como eu deveria fazer determinada frase. Sua voz estava lá, impressionantemente intacta, potente, uma faca, como dizemos. No dia 18 de janeiro de 2008, após o almoço em família, Pier-Miranda foi fazer a sesta. Morreu dormindo. Deixa para mim e para tantos outros, a lembrança do homem/cantor que foi.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

LA BOHÈME

La Bohème, de Giacomo Puccini, é uma das minhas óperas favoritas. A primeira que ouvi. Meu pai me deu uma gravação (acima) que, mais tarde, vim a saber que é maravilhosa. Conheço bem a ópera, várias de suas gravações e vídeos, mas tive uma experiência muito bonita. Cantei La Bohème em forma de concerto. A música de Puccini é repleta de melodias, frases de beleza inigualável, texto pra lá de romantico. Estávamos, os cantores, no meio da orquestra, mais precisamente entre o maestro e as primeiras estantes das cordas. Desde os primeiros ensaios com a orquestra tive a impressão de pertencer, literalmente, à música. Uma sensação forte de ser, talvez, uma cor daquele quadro tão lindo e extenso. Acho que ali entendi que ser solista é apenas dar uma contribuição para algo muito maior; é colocar alguns tijolos numa construção.